TJSP 28/11/2011 -Pág. 281 -Caderno 3 - Judicial - 1ª Instância - Capital -Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Segunda-feira, 28 de Novembro de 2011
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Capital
São Paulo, Ano V - Edição 1084
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de exportação e muito menos exportar tais bens. Assim como não cabia à Deloitte - como dito e repetido - fiscalizar a
movimentação física da soja. Não. Tudo isso, bem como emitir os documentos fiscais e realizar a respectiva escrituração
contábil, cabia à Ficap (cláusula 5ª, “c”, do contrato firmado com a Globalbank - fls. 62), proprietária da soja, e às empresas por
ela contratadas, tudo sob a supervisão logística da Globalbank, conforme atesta o contrato celebrado entre Globalbank e Ficap
(fls. 59/63). Como se viu, o mesmo era estipulado pelo contrato de parceria celebrado entre Master e Globalbank (doc. 17). Viuse que o aludido instrumento estipula a obrigação da Globalbank de realizar o acompanhamento logístico das operações
(“considerando” 47.2) e as obrigações da Master de (I) coordenar a elaboração dos contratos entre o CLIENTE (isto é, Ficap) e
as empresas que participarem das operações (cláusula 3ª, “c”) e (II) de obter os documentos necessários junto às empresas que
participaram das operações (cláusula 3ª, “d”). Foi a suposta falta dessas operações, e não a atuação da Deloitte - absolutamente
correta, como se demonstra -, que levaram à situação narrada na inicial. Repita-se à exaustão. A Ficap não foi autuada por ter
realizado o aproveitamento dos créditos pura e simplesmente. Foi autuada, sim, porque aproveitou os créditos mesmo tendo
emitido e escriturado documentos fiscais que (agora) ela qualifica de fraudulentos e por ter celebrado com a Santa Cruz, Rubi e
Canorp contratos que ela agora chama de fictícios. Ou seja, a Ficap foi autuada justamente porque não teria realizado as
operações que disse ter realizado, afirmando-o não somente na defesa fiscal, como também por meio dos documentos que ela
emitiu e contabilizou (fls. 181/197, 203/217, 236/237 e doc. 1 a doc. 16). Por outro ângulo, mas refletindo a mesma afirmação,
tem-se que a operação foi apresentada à Ficap no pressuposto de que a Ficap realizaria as etapas exaustivamente descritas e
as operações ali contidas, não assim, que os créditos fiscais seriam aproveitados com base em documentos fraudulentos e
contratos simulados, retratando operações fictícias de emissão dela própria. Isso é inimaginável!!! Se fraude houve na emissão
dos documentos fiscais, o ilícito não foi perpetrado pela Deloitte e nem era de seu conhecimento. Basta ler o contrato celebrado
entre Globalbank e Ficap (fls. 59/63 dos autos). Para ver que a realização das operações que dariam ensejo ao aproveitamento
com a indicação (dos parceiros) pela Globalbank. É o que diz a cláusula do aludido instrumento celebrado entre elas (fls. 60/61):
“CLÁUSULA TERCEIRA - OBRIGAÇÕES DA CONTRATADA [Globalbank]: A contratada [Globalbank] obriga-se a: A - Indicar as
operações de performances para aquisição pela CONTRATANTE [Ficap], de tal forma que a CONTRATANTE [Ficap] tenha
direito ao crédito presumido de IPI de exportação, cujo valor total será indicado a cada operação, mediante contratos firmados
para implementação dos negócios. A cada operação, a CONTRATADA [Globalbank] apresentará planilha detalhada da operação
e o beneficio apurado, devendo a CONTRATANTE [Ficap] dar aprovação por escrito da operação, ficando a referida planilha
parte integrante deste contrato (...)”. Como se vê, no que toca às operações que ensejariam o aproveitamento do crédito fiscal,
deveriam elas ser indicadas pela Globalbank e aprovadas e realizadas pela Ficap por escrito, uma por uma. Quer isto dizer que
a Ficap deveria, de fato, aprovar e efetivamente realizar cada uma das operações que agora chama de fictícias e em função das
quais ela emitiu ou permitiu que fossem emitidos documentos fiscais que agora diz serem fraudulentos e por cuja legalidade,
lembre-se, assumiu responsabilidade (cláusula 5ª, “c”, do contrato firmado com a Globalbank - fls. 62). Em momento algum a
Ficap conseguiu demonstrar o fantasiado conluio entre a Globalbank, a Master a e Deloitte, cuja tese pretendeu sustentar a
solidariedade alardeada na inicial. A Ficap limita-se a repetir insistentemente na existência desse alegado “conluio”, mas não
traz qualquer elemento concreto que suporte tal alegação. Em nenhum momento a Deloitte agiu de maneira orquestrada com
quem quer que seja e nem tomou parte em falsificação de documentos ou coisa que o valha. Não praticou nenhum ilícito e é por
isso que nenhuma prova de tais “ilícitos” por parte da Deloitte foi trazida aos autos. Se os documentos disponibilizados à
Deloitte para análise foram, ao que alegou o Fisco, representativos de operações não realizadas e se os contratos celebrados
pela Ficap não passam de contratos simulados, a Deloitte não teria como verificar isso e nem lhe caberia tal responsabilidade.
A Deloitte agiu no pressuposto de que os documentos que lhe eram fornecidos pela Ficap e seus parceiros comerciais
representavam negócios efetivamente realizados, jamais que eram falsos ou simulados. Quando surgiram dúvidas sobre tais
documentos, a Deloitte prontamente comunicou os fatos à autoridade competente: à Polícia e foi a única que o fez. Repita-se
agora na análise de mérito. A Deloitte foi contratada pela Globalbank para analisar documentos fiscais, registros contábeis e
contratos - ou seja, apenas documentos - emitidos pela Ficap, como reflexo das operações que viessem a ser concretamente
realizadas, analisando-os conforme fossem sendo cumpridas (ou não) as fases - de um a cinco - conforme o tal item “c” do
contrato “Globalbank x Deloitte” (datado de 09/12/2002 - fls. 64/67). É o que diz claramente o contrato celebrado entre Globalbank
e Deloitte (fls. 64/67): “Essas operações representam a prestação de serviços a determinadas empresas que operam no mercado
de soja consistente no seguinte: (...) c)Apoio nos aspectos fiscais e contábeis da referida movimentação. Como a CONTRATANTE
[Globalbank] não possui a experiência necessária para realizar o item ‘c’ dessa cláusula, celebrou com a CONTRATADA [Deloitte]
a realização do seguinte escopo de trabalho: Fase 1 - Aquisição da soja em grãos: verificação da documentação suporte (notas
fiscais e contratos) e correspondentes registros e escrituração nos livros fiscais e contábeis das empresas compradoras e
vendedoras da soja; Fase 2 - Remessa da soja para Industrialização: verificação das operações de remessas simbólicas (notas
fiscais) efetuadas entre os estabelecimentos da vendedora para a industrializadora; Fase 3 - Industrialização por encomenda:
verificação da documentação suporte (notas fiscais e contratos) e correspondentes registros e escriturações nos livros fiscais e
contábeis, da operação de remessa e respectivo retorno de Industrialização por encomenda, efetuada entre a empresa
industrializadora e a compradora de soja; Fase 4 - Venda para trading: verificação da documentação suporte (notas fiscais,
contratos) da operação de vendas da compradora de soja para a trading e correspondentes registros nos livros fiscais e
contábeis; Fase 5 - Comprovação das Exportações: verificação da documentação comprobatória das exportações realizadas”.
Obviamente, cabia ao dono do negócio, à Ficap, ou a quem ela tivesse delegado tal função, certificar-se de que as operações
que ela contratou - e pelas quais ela Ficap pagou vultosas quantias - e em respaldo das quais ela emitiu os documentos fiscais
e realizou a escrituração contábil cabível, estavam de fato sendo levadas a bom termo. Se não o fez, devem responder pela sua
negligência. A legislação fiscal do Estado de São Paulo determina de forma expressa que o dono do negócio deve fazer avaliação
de seu inventário de mercadorias. É de se supor que a Ficap tenha cumprido esta obrigação legal, já que fazia até mesmo
consignar em suas notas fiscais inclusive a localização da soja. Se não cumpriu, a responsabilidade é só dela, jamais da
Deloitte, a quem examinar documentos. A função de auditor não engloba - e nem nunca englobou, em nenhum lugar do mundo
- a de investigador policial. Não se pode exigir agora da Deloitte a responsabilidade por ter recebido para exame documentos
(agora) alegadamente falsos, que não representariam negócios concretos, especialmente quando (I) foram emitidos e celebrados
pela própria Autora e parceiros e (II) não esteve no escopo do trabalho qualquer checagem física da movimentação da soja. Em
se tratando de documentos agora admitidamente fraudulentos e contratos simulados, emitidos e celebrados pela Ficap ou por
quem esta indicou para tanto, não cabe qualquer responsabilização à Deloitte. Ou seja, a Ficap e seus parceiros emitiram
documentos, que agora a Ficap admite serem falsos ou não corresponderem a negócios reais, e quer responsabilizar a Deloitte,
por não ter alertado que aos documentos não correspondiam negócios reais! É totalmente descabida e equivocada a pretensão!
Portanto, se tal documentação é fraudulenta, se foi falsificada ou foram duplicadas as notas fiscais e outros documentos já
existentes, não cabia a Deloitte descobrir isso. Obviamente, não era obrigação da Deloitte verificar se a Ficap, ou alguém por
ela escolhido entregar-lhe-ia documentos falsificados, elaborados em fraude ou representativos de operações fictícias. Nunca
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