Suspeito de matar delegada na Bahia confessa que usou cinto de segurança contra o pescoço dela e inventou versão de sequestro

Tancredo Neves teve a prisão em flagrante convertida em preventiva nesta segunda-feira (12). Corpo de Patrícia Neves Jackes Aires foi encontrado em área de mata na Região Metropolitana de Salvador, no domingo (11).

O suspeito de matar a delegada Patrícia Neves Jackes Aires admitiu que inventou para a polícia a versão que os dois teriam sido sequestrados. Tancredo Neves falou que “girou o cinto de segurança no pescoço dela” para se defender de supostas agressões durante uma discussão.

A declaração foi dada em depoimento nesta segunda-feira (12), na 37ª Delegacia Territorial da Bahia, em São Sebastião do Passe, na Região Metropolitana de Salvador. Após a audiência de custódia, ele teve a prisão em flagrante convertida em preventiva.

A mulher foi encontrada morta no domingo (11), dentro do próprio carro, em uma área de mata em São Sebastião do Passé. Para a Polícia Civil, Tancredo Neves, de 26 anos, companheiro dela, é o principal suspeito do feminicídio.

A causa da morte ainda é investigada, no entanto, a suspeita é de que ela tenha sido vítima de estrangulamento, pois o investigado confessou que “girou o cinto de segurança no pescoço dela” e começou a enforcá-la, com o objetivo de fazer a mulher parar de bater nele.

Detalhes do depoimento

Na primeira versão, Tancredo relatou que por volta de meia-noite de domingo, os dois teriam saído da cidade onde a vítima morava, Santo Antônio de Jesus, no recôncavo, com destino a Salvador.

Após a praça de pedágio pedágio de Amélia Rodrigues, na BR-324, o casal teria sido abordado por três indivíduos em uma motocicleta. Tancredo chegou a dizer que os dois foram vítimas de um sequestro e obrigados a fazer transferência de dinheiro. Ele foi supostamente liberado às margens da rodovia e os criminosos seguiram no carro com Patrícia.

Em novo depoimento, ao qual o g1 teve acesso, Neves detalhou outra versão do ocorrido e disse estar contando a verdade após passar a noite pensativo e se arrepender do que fez.

O suspeito contou que os dois saíram para beber em Santo Antônio de Jesus, e Patrícia ficou alcoolizada, segundo ele. Na saída do estabelecimento, a delegada teria decidido viajar para Salvador a fim de comprar roupas. O homem relatou que durante a viagem eles pararam para urinar na BR-101, no trecho de Sapeaçu, no recôncavo. Ainda no trajeto, disse para a mulher que os dois precisavam repensar a relação.

Tancredo detalhou que a mulher “nunca saía armada e na noite do ocorrido não foi diferente”, contudo, já havia sido ameaçado com arma de fogo, e que ela perdia o controle emocional com frequência.

A reação de Patrícia, segundo Tancredo, foi de descontrole e ameaças de morte contra a família e a filha dele. Nesse momento, ela puxou o volante do carro, provocando a colisão contra uma árvore.

Depois, Patrícia começou a bater no companheiro, que usou enrolou o cinto de segurança no pescoço dela. Segundo ele, o objetivo não era matar a delegada, e sim fazer com que ela parasse as agressões.

O homem ainda disse que notou que Patrícia estava desacordada após menos de um minuto, saiu do carro e chamou a polícia. Conforme Neves, ele não sabia que a mulher estava morta.

Neves ainda disse que casaria com a chefe de polícia na próxima quarta-feira (14), apenas três dias após ela ter sido assassinada. O homem contou que conheceu Patrícia em novembro de 2023, em um restaurante de Santo Antônio de Jesus. A delegada atuava como plantonista na unidade policial da cidade. [Veja detalhes abaixo]

O relacionamento, segundo ele, teve início há cerca de quatro meses. O homem reconheceu que houve agressões verbais ao longo desse período, mas negou que tenha ocorrido qualquer episódio de violência física ou sexual.

Apesar disso, ele chegou a ser preso em flagrante maio deste ano por agressão contra Patrícia. Tancredo afirmou que ela caiu sozinha, argumentou ter provado inocência no caso e ressaltou que a vítima retirou a medida protetiva de urgência que pediu contra ele. O homem foi solto por decisão judicial e o casal se reconciliou.

Queixas de outras mulheres e exercício ilegal da Medicina

Antes de se relacionar com a delegada, Neves já colecionava denúncias e processos apresentados por outras mulheres com as quais se relacionou. Em todos os casos, ele nega as agressões.

Questionado sobre o que explicaria o fato de “tantas mulheres terem registrado fatos” contra ele, o homem alegou apenas que “xinga muito”.

O investigado também é alvo de um inquérito por exercício ilegal da Medicina. Neves reconheceu a existência do processo, contudo, nunca foi intimado, conforme ele. O homem se apresenta como médico, formado no Paraguai, mas disse que não exerce a profissão.

Os indiciamentos por exercício ilegal da medicina e falsidade ideológica aconteceram depois que a Polícia Civil de Euclides da Cunha concluiu as investigações em 2022. Os documentos foram remetidos ao Ministério Público da Bahia (MP-BA).

Por meio de nota, o Conselho Regional de Medicina do Estado da Bahia (Cremeb) informou que não há nenhum médico registrado com o nome de Tancredo Neves Lacerda Feliciano de Arruda.

Quem era Patrícia Jackes
Patrícia Neves Jackes Aires, de 39 anos, nasceu em Recife, capital pernambucana, e tinha um filho. Bacharel em Direito e especialista em Direito Penal e Processo Penal, a delegada tomou posse em 2016, sendo designada em seguida para a delegacia de Barra, no oeste da Bahia.

Depois, comandou as delegacias de Maragogipe e São Felipe, antes de ter sido lotada em Santo Antônio de Jesus, onde atuava como plantonista.

Patrícia Jackes tinha forte atuação na prevenção e enfrentamento às violências de gênero. Em 2021, ela passou pelo Núcleo Especializado de Atendimento à Mulher (NEAM), da 4ª Coordenadoria de Polícia, no município de Santo Antônio de Jesus (BA).

Antes de se formar em Direito, Patrícia se graduou em Licenciatura Plena em Letras. Ela trabalhou por 12 anos como professora de língua portuguesa e língua inglesa.

Luto
Em nota, a Polícia Civil lamentou profundamente a morte da servidora e garantiu que está empenhada com todos os seus departamentos para esclarecer as circunstâncias do crime e realizar as providências cabíveis. O Sindicato dos Policiais Civis também se solidarizou com familiares e amigos da vítima.

A Delegada-Geral da Polícia Civil da Bahia, Heloísa Campos de Brito, também lamentou o ocorrido através de uma publicação em uma rede social.

“Acordei com a triste notícia da partida da delegada Patrícia Neves Jackes Aires, que estava lotada no plantão da Delegacia Territorial de Santo Antônio de Jesus. Meus sentimentos aos familiares e colegas de profissão”, escreveu na legenda da postagem.

A Secretária das Mulheres do Estado disse que “a delegada Patrícia tinha uma carreira promissora, inclusive com forte atuação na prevenção e enfrentamento às violências de gênero”.

O corpo de Patrícia Jackes foi velado na manhã desta segunda-feira (12), na Câmara de Vereadores de Santo Antônio de Jesus. O sepultamento será na terça (13), em Recife.

 

O que se sabe e o que falta esclarecer sobre delegada morta por companheiro na Bahia

Corpo de Patrícia Neves Jackes Aires foi encontrado em área de mata no domingo (11). Tancredo Neves teve a prisão em flagrante convertida em preventiva na segunda-feira (12).

A delegada Patrícia Neves Jackes Aires, de 39 anos, foi encontrada morta no domingo (11) dentro do próprio carro, em uma área de mata, no município de São Sebastião do Passé, na Região Metropolitana de Salvador.

O companheiro dela, identificado como Tancredo Neves, de 26 anos, foi preso em flagrante e é o principal suspeito do crime. Ele admitiu que inventou para a polícia a versão que os dois teriam sido sequestrados.

Tancredo Neves falou que “girou o cinto de segurança no pescoço dela” para se defender de supostas agressões durante uma discussão.

Veja abaixo o que se sabe e o que falta esclarecer sobre o crime:

1. Como a delegada apareceu morta?
Patrícia Neves Jackes foi encontrada morta, no banco do carona do próprio carro, em uma área de mata, no município de São Sebastião do Passé, na Região Metropolitana de Salvador.

2. Por que o namorado dela foi apontado como suspeito?
A Polícia Civil passou a considerar Tancredo Neves como suspeito de matar a companheira após ele procurar uma delegacia e informar que os dois tinham sido sequestrados. Inicialmente, ele disse que tinha sido liberado e que os criminosos tinha seguido com Patrícia no carro dela.

A polícia iniciou as investigações e ao encontrar o corpo de Patrícia, não encontrou indícios de um possível sequestro. Tancredo Neves passou a ser considerado suspeito de cometer feminicídio, porque ele já tinha sido preso em maio deste ano, suspeito de agredir a delegada fisicamente.

3. O suspeito confessou o crime?
Em depoimento na segunda-feira (12), Tancredo Neves admitiu que inventou para a polícia a versão que os dois teriam sido sequestrados. O suspeito falou que “girou o cinto de segurança no pescoço dela” para se defender de supostas agressões durante uma discussão.

A causa da morte ainda é investigada, no entanto, a suspeita é de que ela tenha sido vítima de estrangulamento, pois o investigado confessou que “girou o cinto de segurança no pescoço dela” e começou a enforcá-la, com o objetivo de fazer a mulher parar de bater nele.

4. Qual o relato do suspeito?
O suspeito contou para a polícia que os dois saíram para beber em Santo Antônio de Jesus, e Patrícia ficou alcoolizada, segundo ele. Na saída do estabelecimento, a delegada teria decidido viajar para Salvador a fim de comprar roupas.

Tancredo Neves relatou que durante a viagem eles pararam para urinar na BR-101, no trecho de Sapeaçu, no recôncavo. Ainda no trajeto, disse para a mulher que os dois precisavam repensar a relação.

O suspeito detalhou que a mulher “nunca saía armada e na noite do ocorrido não foi diferente”, contudo, já havia sido ameaçado com arma de fogo, e que ela perdia o controle emocional com frequência.

A reação de Patrícia, segundo Tancredo, foi de descontrole e ameaças de morte contra a família e a filha dele. Nesse momento, ela puxou o volante do carro, provocando a colisão contra uma árvore.

Depois, Patrícia começou a bater no companheiro, que usou enrolou o cinto de segurança no pescoço dela. Segundo ele, o objetivo não era matar a delegada, e sim fazer com que ela parasse as agressões.

O homem ainda disse que notou que Patrícia estava desacordada após menos de um minuto, saiu do carro e chamou a polícia. Conforme Tancredo Neves, ele não sabia que a mulher estava morta.

5. Qual o histórico policial do suspeito?

Antes de se relacionar com a delegada, Tancredo Neves já colecionava denúncias e processos apresentados por outras mulheres com as quais se relacionou. Em todos os casos, ele nega as agressões.

Questionado sobre o que explicaria o fato de “tantas mulheres terem registrado fatos” contra ele, o homem alegou apenas que “xinga muito”.

O investigado também é alvo de um inquérito por exercício ilegal da Medicina. Tancredo Neves reconheceu a existência do processo, contudo, nunca foi intimado, conforme ele.

O homem se apresenta como médico, formado no Paraguai, mas disse que não exerce a profissão. Os indiciamentos por exercício ilegal da medicina e falsidade ideológica aconteceram depois que a Polícia Civil de Euclides da Cunha concluiu as investigações em 2022. Os documentos foram remetidos ao Ministério Público da Bahia (MP-BA).

Por meio de nota, o Conselho Regional de Medicina do Estado da Bahia (Cremeb) informou que não há nenhum médico registrado com o nome de Tancredo Neves Lacerda Feliciano de Arruda.

6. Quem era a delegada?

Patrícia Neves Jackes Aires nasceu em Recife, capital pernambucana, e tinha um filho. Bacharel em Direito e especialista em Direito Penal e Processo Penal, a delegada tomou posse em 2016, sendo designada em seguida para a delegacia de Barra, no oeste da Bahia.

Depois, comandou as delegacias de Maragogipe e São Felipe, antes de ter sido lotada em Santo Antônio de Jesus, onde atuava como plantonista.

Patrícia Jackes tinha forte atuação na prevenção e enfrentamento às violências de gênero. Em 2021, ela passou pelo Núcleo Especializado de Atendimento à Mulher (NEAM), da 4ª Coordenadoria de Polícia, no município de Santo Antônio de Jesus (BA).

Antes de se formar em Direito, Patrícia se graduou em Licenciatura Plena em Letras. Ela trabalhou por 12 anos como professora de língua portuguesa e língua inglesa.

 

Corpo de delegada morta na Bahia é velado sob forte comoção: ‘Era um relacionamento totalmente tóxico’, diz amiga da vítima

Corpo de Patrícia Neves Jackes Aires foi velado nesta segunda (12), em Santo Antônio de Jesus, no recôncavo. Tancredo Neves, companheiro dela, é o principal suspeito do feminicídio.

O velório da delegada Patrícia Neves Jackes Aires, encontrada morta dentro do próprio carro na Região Metropolitana de Salvador (RMS), foi marcado por forte comoção e pedidos de justiça. A despedida aconteceu nesta segunda-feira (12), na Câmara de Vereadores de Santo Antônio de Jesus, no recôncavo, onde ela atuava como plantonista na unidade policial.

A mulher foi localizada no domingo (11), em uma área de mata em São Sebastião do Passe, cidade na RMS. O companheiro dela, Tancredo Neves, de 26 anos, foi preso em flagrante como principal suspeito do crime.

Familiares e amigos de corporação se reuniram para se despedir de Patrícia, que tinha 39 anos e era mãe de uma criança de 7 anos. Além de manifestarem a dor da perda, muitos aproveitaram o momento para pedir que ele permaneça preso.

O velório também contou com a presença da Delegada-Geral da Polícia Civil da Bahia, Heloísa Brito. O sepultamento será na terça (13), em Recife, onde a vítima nasceu.

Em entrevista à TV Subaé, afiliada da Rede Bahia na região, Dica Marques, amiga de Patrícia, relatou que a relação entre a delegada e o suspeito do crime era conturbada.

“Era um relacionamento totalmente tóxico. Eu falava várias vezes para ela largar ele e que ela não precisava disso. Eu dizia que ela era a mulher do movimento contra a violência feminina. Ele já tinha batido nela antes e mesmo assim ela falava que ele mudou”, contou.
Outra amiga de Patrícia, Vera Araújo, disse que no sábado (10), a delegada falou que precisava conversar sobre algo importante com ela. No entanto, as duas não se encontraram a tempo de evitar o pior.

“Eu disse a ela onde eu estava para que ela pudesse ir, na casa de uma escrivã, amiga nossa, para que a gente pudesse conversar, mas ela não me retornou”, detalhou.
Suspeito confessa crime

O suspeito de matar a delegada Patrícia Jackes afirmou ter inventado a versão que os dois teriam sido sequestrados. Tancredo Neves falou à polícia que “girou o cinto de segurança no pescoço dela” para se defender de agressões durante uma discussão. A causa do óbito ainda é investigada.

A declaração de Tancredo Neves foi dada em depoimento, nesta segunda-feira (12), na 37ª Delegacia Territorial da Bahia (DT/São Sebastião do Passé). Após passar por audiência de custódia, ele teve a prisão em flagrante convertida em preventiva.

Na primeira versão, Tancredo relatou que por volta de meia-noite de domingo, os dois teriam saído da cidade onde a vítima morava, Santo Antônio de Jesus, no recôncavo, com destino a Salvador.

Após a praça de pedágio pedágio de Amélia Rodrigues, na BR-324, o casal teria sido abordado por três indivíduos em uma motocicleta. Tancredo chegou a dizer que os dois foram vítimas de um sequestro e obrigados a fazer transferência de dinheiro. Ele foi supostamente liberado às margens da rodovia e os criminosos seguiram no carro com Patrícia.

Em novo depoimento, Neves detalhou outra versão do ocorrido e disse estar contando a verdade após passar a noite pensativo e se arrepender do que fez.

O suspeito contou que os dois saíram para beber em Santo Antônio de Jesus, e Patrícia ficou alcoolizada, segundo ele. Na saída do estabelecimento, a delegada teria decidido viajar para Salvador a fim de comprar roupas. O homem relatou que durante a viagem eles pararam para urinar na BR-101, no trecho de Sapeaçu, no recôncavo. Ainda no trajeto, disse para a mulher que os dois precisavam repensar a relação.

Tancredo detalhou que a mulher “nunca saía armada e na noite do ocorrido não foi diferente”, contudo, já havia sido ameaçado com arma de fogo, e que ela perdia o controle emocional com frequência.

A reação de Patrícia, segundo Tancredo, foi de descontrole e ameaças de morte contra a família e a filha dele. Nesse momento, ela puxou o volante do carro, provocando a colisão contra uma árvore.

Depois, Patrícia começou a bater no companheiro, que usou enrolou o cinto de segurança no pescoço dela. Segundo ele, o objetivo não era matar a delegada, e sim fazer com que ela parasse as agressões.

O homem ainda disse que notou que Patrícia estava desacordada após menos de um minuto, saiu do carro e chamou a polícia. Conforme Neves, ele não sabia que a mulher estava morta.

Neves ainda disse que casaria com a chefe de polícia na próxima quarta-feira (14), apenas três dias após ela ter sido assassinada. O homem contou que conheceu Patrícia em novembro de 2023, em um restaurante de Santo Antônio de Jesus. A delegada atuava como plantonista na unidade policial da cidade. [Veja detalhes abaixo]

O relacionamento, segundo ele, teve início há cerca de quatro meses. O homem reconheceu que houve agressões verbais ao longo desse período, mas negou que tenha ocorrido qualquer episódio de violência física ou sexual.

Apesar disso, ele chegou a ser preso em flagrante maio deste ano por agressão contra Patrícia. Tancredo afirmou que ela caiu sozinha, argumentou ter provado inocência no caso e ressaltou que a vítima retirou a medida protetiva de urgência que pediu contra ele. O homem foi solto por decisão judicial e o casal se reconciliou.

Antes de se relacionar com a delegada, Neves já colecionava denúncias e processos apresentados por outras mulheres com as quais se relacionou. Em todos os casos, ele nega as agressões.

Questionado sobre o que explicaria o fato de “tantas mulheres terem registrado fatos” contra ele, o homem alegou apenas que “xinga muito”.

O investigado também é alvo de um inquérito por exercício ilegal da Medicina. Neves reconheceu a existência do processo, contudo, nunca foi intimado, conforme ele. O homem se apresenta como médico, formado no Paraguai, mas disse que não exerce a profissão.

Os indiciamentos por exercício ilegal da medicina e falsidade ideológica aconteceram depois que a Polícia Civil de Euclides da Cunha concluiu as investigações em 2022. Os documentos foram remetidos ao Ministério Público da Bahia (MP-BA).

Por meio de nota, o Conselho Regional de Medicina do Estado da Bahia (Cremeb) informou que não há nenhum médico registrado com o nome de Tancredo Neves Lacerda Feliciano de Arruda.

Quem era Patrícia Jackes

Bacharel em Direito e especialista em Direito Penal e Processo Penal, ela tomou posse como delegada em 2016, sendo designada em seguida para a delegacia de Barra, no oeste. Depois, comandou as delegacias de Maragogipe e São Felipe, antes de ser lotada em Santo Antônio de Jesus, onde atuava como plantonista.

Patrícia Jackes tinha forte atuação na prevenção e enfrentamento às violências de gênero. Em 2021, ela passou pelo Núcleo Especializado de Atendimento à Mulher (NEAM), da 4ª Coordenadoria de Polícia, no município de Santo Antônio de Jesus (BA).

Antes de se formar em Direito, Patrícia se graduou em Licenciatura Plena em Letras. Ela trabalhou por 12 anos como professora de língua portuguesa e língua inglesa.

Empresário Manoel Conde Neto é condenado em investigação sobre sonegação de impostos no mercado de medicamentos

Decisão é em 1ª instância e cabe recurso. Empresário e mais seis pessoas foram condenados por crimes de ocultação de bens e organização criminosa

A Justiça de São José dos Campos condenou o empresário Manoel Conde Neto e outras seis pessoas por envolvimento em um esquema de sonegação de impostos no mercado de medicamentos. A condenação é pelos crimes de ocultação de bens e organização criminosa.

A decisão em 1ª instância é do juiz Brenno Gimenes Cesca, da 2ª Vara Criminal de São José dos Campos, e cabe recurso. No início da sentença, da última sexta-feira (18), ele destaca as alegações da denúncia do Ministério Público.

“De meados de 2012 até julho de 2017, nas cidades de São José dos Campos, São Paulo e outras (…) os réus promoveram, constituíram e integraram, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa (…) com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem econômica (…) em especial os crimes de lavagem de dinheiro, falsidade ideológica de documento público, e crimes contra a ordem tributária”.

Na sequência, afirma que os réus:

“Ocultaram e dissimularam de forma reiterada, e por diversas vezes, a natureza, origem, disposição, movimentação e propriedade de valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal”.

Como funcionava o esquema?

O caso foi mostrado pelo Fantástico, em janeiro de 2021. Em um processo normal, o remédio é fabricado na indústria, vai para uma distribuidora, e depois para uma farmácia.

Em São Paulo o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) é de 18%. No caso denunciado, o esquema percorria mais de 2 mil quilômetros para escapar da cobrança.

Ele seguia para Goiás para conseguir um ICMS mais baixo. Depois, retornava para São Paulo, para uma distribuidora, ainda de acordo com a denúncia, criada em nome de um laranja, onde parte do imposto era sonegada. O remédio então seguia para farmácia.

Empresário, fiscal e mais quatro condenados

Em acordo de colaboração premiada, o empresário Manoel Conde Neto admitiu o esquema. Ao longo do processo, o Ministério Público pediu a devolução de R$ 1 bilhão aos cofres públicos. E a Justiça bloqueou imóveis de Conde.

Ao condenar o empresário, o magistrado corrigiu o valor para R$ 1,7 bilhão. E, por isso, manteve 13 imóveis sequestrados.

Além dele, a Justiça também condenou o fiscal da secretaria da fazenda de São Paulo, David Mariano Domingos. Segundo o Ministério Público, quando soube da investigação, ele pediu aposentadoria.

Nesta terça, por meio de nota, a Secretaria da Fazenda de São Paulo afirmou que a aposentadoria de David foi cassada em abril “após processo disciplinar conduzido pela corregedoria da fiscalização tributária”.

David Mariano Domingos, os funcionários do grupo Conde José Roberto de Souza e Leandro Lopes Batista, o advogado Michel Oliveira Domingos, o comprador da distribuidora Hiperdrogas Marcelo Luis Silva Relvas e Rafael Gomes Benez, também da Hiperdrogas, foram condenados a 8 anos e 9 meses de prisão e pagamento de multas por envolvimento no esquema.

Um dos empresários mais bem sucedidos do Vale do Paraíba, Manoel Conde Neto teve a pena de quatro anos e oito meses de reclusão substituída por prestação de serviços à comunidade e pagamento de multa por causa do acordo de colaboração premiada.

Defesa de Conde contesta condenação

A defesa de Conde disse que vai recorrer porque entende que a homologação do acordo previa a extinção de qualquer pena.

“Quando ele faz o acordo de colaboração premiada, ele confessa os fatos que são imputados a ele. Isso faz parte do acordo. Isso nunca foi negado, ele quando foi interrogado em juízo assumiu com toda hombridade que realmente ele tinha feito esse acordo livremente. E cumpriu todas as condições do acordo”, disse Sérgio Badaró.

“Esse é um processo que se arrasta já há bastante tempo e o Manoel fez um acordo de colaboração premiada com o Ministério Público. Esse acordo foi homologado e uma das condições do acordo é que se ele cumprisse todas as determinações e alcançasse um determinado patamar de arrecadação de ICMS de outras empresas pela Secretaria da Fazenda ele teria direito ao perdão judicial. O Ministério Público apresentou alegação escrita dele e reconheceu que o Manoel cumpriu todas as condições. Quando saiu essa decisão não reconhecendo o direito de perdão judicial, nós ficamos absolutamente perplexos”, completou.

O que diz o Ministério Público

O promotor Alexandre Affonso Castilho, do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), esclareceu que o acordo de delação premiada não está vinculado ao poder judiciário, que pode aceitar ou não os itens acordados.

“O acordo para o Ministério Público foi cumprido pelos colaboradores, mas as cláusulas do acordo – apesar de homologados – não vinculam o poder judiciário. Então dentro dos benefícios ali pactuados, o poder judiciário pode escolher o que entender cabível dentro do processo”, disse.

“Em termos de recuperação de ativos que é uma das políticas criminais do Ministério Público de São Paulo, entendemos que a recupração de mais de R$ 1 bilhão aos cofres do erario é algo que nos satisfaz. Também o fato de conseguirmos desarticular esse esquema fiscal estruturado. Ou seja, nós conseguirmos, nessas vertentes, atuar em todos os pontos quando a gente trata de crime de colarinho branco”, completou.

Defesa dos condenados

 

A Rede Vanguarda tentou contato com a defesa de todos os condenados:

  • Os advogados de Michel Oliveira Domingos e David Mariano Domingos, que teve a aposentaria como fiscal cassada pela Secretaria da Fazenda, ficaram de dar um retorno, mas ainda não deram.
  • As defesas de Marcelo Luis Silva Relvas e Rafael Gomes Benez informaram que “com o máximo respeito pelo Poder Judiciário, a Defesa continuará trabalhando para provar a inocência de Rafael Gomes Benez e Marcelo Luis Silva Relvas.” O envio da nota foi feito pelo escritório Zanoide, Braun e Castilho, que representa os dois.
  • Nós não conseguimos falar com a defesa de José Roberto de Souza e Leandro Lopes Batista, ex-funcionários do grupo Conde.
Deborah Secco foi usada como ‘laranja’ pelo pai, diz defesa

A atriz Deborah Secco, os dois irmãos e a mãe foram usados pelo pai dela, o empresário Ricardo Ribeiro Secco, como laranjas no esquema que desviou R$ 58,7 milhões dos cofres do Estado. Esta foi a tese defendida pela família, que ontem, pela primeira vez, se defendeu das acusações do Ministério Público Estadual (MP) de participação no esquema de desvio de recursos públicos.

Por meio do advogado Sérgio Tostes, eles afirmaram não ter conhecimento das contas bancárias para onde foram desviados R$ 894 mil do golpe. “Eles não sabiam dessas contas. Foram inteiramente usados pelo pai nesse esquema”, defendeu Tostes. O pai de Deborah, Ricardo Secco, é apontado como o responsável pelas operações do esquema e pelos pagamentos.

Segundo as investigações do Ministério Público, dois cheques no valor de R$ 158,1 mil foram depositados na conta pessoal da atriz. Foram parar na conta da empresa Luz Produções, na qual Deborah tem 99% das ações, outros R$ 163,7 mil. No total, conforme a denúncia do MP, a atriz, os dois irmãos, os pais e a madrasta receberam R$ 894 mil.

A investigação mostra ainda que as contas bancárias em nome da atriz, a irmã, Barbara; o irmão, Ricardo Fialho Secco; e sua mãe, Silvia Secco, foram abertas na mesma agência em que 10 empresas e cinco ONGs tinham contas bancárias e onde um dos gerentes permitia saques de altos valores sem informar ao Banco Central, contrariando norma existente. “É possível que eles nem tenham participado pessoalmente da abertura das contas”, completou o advogado.

Deborah e sua família estão com todos os bens bloqueados por decisão da juíza da 3ª Vara de Fazenda Pública, Mirella Letizia Guimarães Vizzini.

Advogado da atriz Deborah Secco, seus irmãos e sua mãe, Sérgio Tostes garantiu que as acusações de participação no desvio de dinheiro público e o bloqueio dos bens em nada alteraram a rotina da família Secco: “Eles não viviam desse dinheiro. É possível que nem tenham aberto essas contas pessoalmente. Deborah é bem-casada e não passará por qualquer sufoco, assim como sua família”, afirmou ele. No entanto, se Deborah tiver conta bancária conjunta com o marido, o jogador de futebol Roger Flores, ele estará na mesma situação que a atriz.

Conforme procedimento de bloqueio, nenhum centavo dos 88 acusados poderá ser movimentado por até 10 dias. Esse é o prazo para que as instituições financeiras informem ao Banco Central qual montante conseguiram bloquear nas contas. A menos que cada um deles tenha, nos bancos, valor acima do bloqueado ( só o casal Garotinho teve R$ 350 milhões sequestrados ) ninguém terá dinheiro disponível. “Dificilmente alguém deixa tanto dinheiro na mira da Justiça”, explica o advogado José Alfredo Lion, especialista em Direito Empresarial.

Esquema das ONGs teve sete empresas fantasmas

Sete empresas fantasmas foram usadas no esquema de desvio de R$ 58,7 milhões dos cofres públicos. Para rastrear o dinheiro e responsabilizar o grupo por lavagem de dinheiro, o Ministério Público Estadual e agentes da Delegacia Fazendária analisam documentos e computadores apreendidos em 17 endereços de oito pessoas ligadas às ONGs, subcontratadas pela Fundação Escola do Serviço Público (Fesp).

Os ex-governadores Anthony e Rosinha Garotinho, 57 pessoas, essas empresas e outras 15, três cooperativas e quatro ONGs são acusados de improbidade administrativa, em ação na 3ª Vara de Fazenda Pública. O grupo teria desviado parte dos R$ 426,4 milhões que a Fesp recebeu em três anos e repassou a 14 ONGs, no período em que Rosinha foi governadora. Os recursos saíram de nove órgãos estaduais. Parte desse dinheiro foi parar na conta que financiou a pré-candidatura de Garotinho à presidente da República, em 2006.

No esquema de lavagem de dinheiro sob investigação participaram as empresas fantasmas Emprim, Inconsul, Intecdat, Acesso Tangua Manutenção Instalação de Equipamentos, Magister, Metodata e Max Express e oito pessoas. Em dois anos, a Emprim e Inconsul receberam quase R$ 30 milhões. Izabel Gatto é uma das principais peças dessa engrenagem. Ela era responsável por confirmar a missão de cheques da Emprim e Inconsul, além de figurar como procuradora de ONGs.

De acordo com inquérito policial, Walter Gatto, irmão de Izabel, recebeu R$ 1,3 milhão. Também receberam dinheiro do esquema o marido dela, José Roberto Ramos, e a cunhada, Márcia Cristina. Porém, o pedido de recolhimento de documentos foi feito apenas para as casas de Izabel e Walter.

Na denúncia do MP à Justiça foi decretada a quebra do sigilo bancário de Walter, Ariovaldo da Hora Filho (que não é alvo da investigação de lavagem de dinheiro) e seis empresas. Alguns dos 88 denunciados por improbidade, como o casal Garotinho e a atriz Deborah Secco, escaparam disso.

Em seu blog, Garotinho avisou que vai processar os promotores sob alegação de perseguição política. Ele alegou ainda que as duas ações contra o casal sobre improbidade administrativa feitas pelo MP foram extintas pela Justiça. Em nota, a instituição repudiou as declarações do ex-governador.

O segundo órgão estadual que mais repassou verbas públicas à Fesp (R$ 85 milhões) Mantém contrato com umas das ONGs denunciadas. No Instituto Vital Brazil (IVB), em Niterói, 140 empregados foram contratados pelo Núcleo de Cidadania e Ação Social (Nucas). O IVB não vai rever o contrato, de 2007.

O IVB explicou que a Nucas, ex-Centro Brasileiro de Defesa dos Direitos da Cidadania (CBDDC), venceu licitação para fornecer mão de obra, ao custo original de R$ 4,4 milhões. O contrato 6.808 foi prorrogado 5 vezes, e hoje vale R$ 17,7 milhões. O deputado estadual Alessandro Molon (PT) pedirá ao MP que investigue por que o serviço com a ONG foi mantido.

Entenda o caso

Em 2007, a investigação que resultou na Operação Águas Profundas esbarrou em outro escândalo envolvendo ONGs ligadas ao governo Rosinha Garotinho, que já teriam favorecido o ex-governador do Rio, Anthony Garotinho, por meio da Fundação Escola do Serviço Público (Fesp).

O empresário Ricardo Secco, pai da atriz Deborah Secco, era então suspeito de repassar aos beneficiários do esquema de licitações, via organizações não-governamentais, recursos do governo do estado, segundo investigações da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público Federal.

Em 2005, Deborah, que participou de propagandas oficiais do governo do Rio, ganhou o título de “Mulher do Ano”, concedido pela Fesp, que transferia dinheiro para ONGs a pretexto de execução de programas sociais.

Calvário prendeu políticos e expôs maior esquema de corrupção da PB

segunda fase foi deflagrada em 1º de fevereiro. Leandro Nunes, ex-assessor da então secretária de Administração do Estado, Livânia Farias, foi preso. Ele havia sido flagrado no mês de agosto de 2018 recebendo R$ 900 mil em uma caixa de vinho. O repasse foi feito em um hotel no Rio de Janeiro por Michele Louzzada Cardoso, que trabalhava com Daniel Gomes, então operador da Cruz Vermelha do Brasil (filial Rio Grande do Sul) e apontado como um dos líderes da organização criminosa

Na mesma etapa da investigação, foram cumpridos mandados de busca e apreensão contra Livânia Farias e o então secretário de Planejamento do Estado, Waldson de Souza. Leandro Nunes foi solto em 6 de março. Em depoimento ao Ministério Público da Paraíba, Leandro assumiu ter recebido o dinheiro ilícito. Ele revelou que a quantia foi usada para financiamento de campanha eleitoral e citou Livânia como mandante de sua ida ao Rio de Janeiro.

Livânia é presa

Em 14 de março, foi deflagrada a terceira fase da Operação Calvário, que cumpriu novamente mandados de busca e apreensão contra Livânia Farias. Também foram alvos seis familiares dela e mais quatro investigados. As atividades ocorreram em João Pessoa, Sousa e Rio de Janeiro.

Dois dias depois, o Ministério Público deflagrou a quarta fase da operação e prendeu Livânia Farias no aeroporto Castro Pinto, quando ela voltava de viagem a Belo Horizonte, Minas Gerais. Dois bens de Livânia, um carro de luxo e uma casa no valor de R$ 400 mil em Sousa, foram sequestrados. Livânia pediu exoneração do cargo logo após a prisão.

Em 23 de abril, a Justiça mandou soltar Livânia Farias, após acordo de delação premiada. No depoimento, ela delatou o uso de R$ 81 mil em 2011 para pagamento de dívidas do candidato eleito ao governo do Estado, Ricardo Coutinho.

Gilberto Carneiro é delatado por ex-secretária

No dia 30 de abril, aconteceu a quarta fase da Operação Calvário. Entraram em cena como principais alvos o ex-procurador-geral do Estado, Gilberto Carneiro, e sua ex-assessora, Maria Laura Caldas de Almeida Carneiro. A participação dos dois no esquema já era apurada. Contra ele, foram cumpridos mandados de busca e apreensão. Já a assessora Maria Laura foi presa. Gilberto Carneiro, assim como Waldson de Souza, foram exonerados de seus cargos poucos instantes antes do anúncio da quarta fase da operação.

De acordo com as investigações, Gilberto Carneiro mantinha contato com Daniel Gomes e Michele Louzzada. O ex-procurador teria, inclusive, se encontrado pessoalmente com Michele no Rio de Janeiro. Além disso, ele e Waldson de Souza trataram, conforme áudio vazado, de assuntos relacionados a fraudes em licitações de projetos no setor de saúde pública.

Calvário chega à Educação e ao Turismo

Na quinta fase, em 9 de outubro, o campo de investigações da Operação Calvário se expandiu. O hoje ex-secretário executivo de Turismo, Ivan Burity, e o então diretor administrativo do Hospital Geral de Mamanguape, Eduardo Simões Coutinho, foram presos. O agora ex-secretário da Educação e da Ciência e Tecnologia, Aléssio Trindade, foi alvo de mandado de busca e apreensão, assim como outros 10 investigados.

Segundo as apurações do Ministério Público, Ivan Burity teria atuado como intermediário na contratação de empresas pelo Estado, mediante recebimento de propina. Ele voltou a ser alvo da Calvário na sexta fase da operação, deflagrada em 15 de outubro, que inseriu a advogada Luciana Ramos Neiva entre os investigados. Ivan Burity foi solto pela Justiça em 11 de dezembro.

Ricardo é preso e apontado como líder da organização criminosa

Em 17 de dezembro, a Polícia Federal foi às ruas para cumprir 17 mandados de prisão preventiva e 54 mandados de busca e apreensão. A sétima fase da Operação Calvário, batizada como Juízo Final, teve como principal alvo o ex-governador da Paraíba, Ricardo Coutinho (PSB). Ele teve prisão decretada pelo desembargador Ricardo Vital e, como estava fora do país, seu nome foi incluído na difusão vermelha da Interpol (organização internacional de polícia criminal).

A ordem judicial foi cumprida no dia 19, quando o ex-governador desembarcou em Natal, Rio Grande do Norte, de uma viagem de férias à Turquia. A prisão de Ricardo foi mantida em audiência de custódia realizada no dia seguinte, mas o ministro Napoleão Nunes, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), mandou soltá-lo no sábado (21).

De acordo com o Ministério Público da Paraíba (MPPB), Ricardo Coutinho era líder do núcleo político da organização criminosa investigada na Operação Calvário, que contava ainda com os núcleos econômico, administrativo e financeiro operacional. Ricardo é apontado como responsável direto pela tomada de decisões e pelos métodos de arrecadação de propina, bem como sua divisão e aplicação. Diálogos do ex-governador com Daniel Gomes, do núcleo econômico, foram inseridos no processo. Na conversa, os dois estariam discutindo valores de supostas propinas.

Ainda conforme o MPPB, Ricardo Coutinho, quando chefe do Executivo Estadual, exercia domínio sobre os demais Poderes. O Tribunal de Contas do Estado da Paraíba (TCE-PB) é suspeito de encobrir, ou até mesmo potencializar, as práticas criminosas investigadas na Operação Calvário. Dois conselheiros do TCE-PB foram suspensos de suas funções por 120 dias.

A Operação Calvário – Juízo Final prendeu, no dia 17 de dezembro, 13 pessoas, sendo nove na Paraíba, duas no Rio Grande do Norte, uma no Paraná e uma no Rio de Janeiro. Na Paraíba, foram presos o ex-procurador-geral do Estado, Gilberto Carneiro; o irmão de Ricardo Coutinho, Coriolano Coutinho; o ex-secretário de Planejamento, Orçamento e Gestão, Waldson de Souza; a prefeita de Conde, Márcia Lucena (PSB); a deputada estadual Estela Bezerra (PSB); o ex-secretário executivo de Educação e ex-coordenador de Metrologia Legal José Arthur Viana Teixeira; o advogado Francisco das Chagas Ferreira; e os empresários Vladimir dos Santos Neiva e Bruno Miguel Teixeira de Avelar Pereira Caldas.

Outras quatro pessoas tiveram prisão preventiva decretada, entre elas a ex-secretária da Saúde e companheira de Estela Bezerra, Cláudia Veras, que foi considerada foragida até o STJ lhe conceder habeas corpus, no dia 21 de dezembro. Na mesma ocasião, foi determinada a soltura do administrador David Clemente Monteiro Correia (também considerado foragido até então), de Francisco das Chagas e de Márcia Lucena.

Ricardo Coutinho se defende

Após ser solto, Ricardo Coutinho concedeu entrevista ao site UOL, em que alega inocência e afirma estar sendo vítima de “perseguição política”. Ricardo classificou como “absurda” a suspeita e disse que o Ministério Público “arrumou” uma delação para acusá-lo. “Mas delação não é prova”, destacou, alegando que seu patrimônio é compatível com o que ganhou ao longo de 28 anos em exercício de cargos políticos.

Para Ricardo Coutinho, atual presidente do PSB na Paraíba, a suposta perseguição se estende a outros membros do partidos. O ex-governador também negou ter recebido propinas de R$ 500 mil mensalmente e falou que os diálogos apresentados na denúncia estão “descontextualizados”, “truncados” e “provavelmente editados”.

Sucessor se pronuncia

O atual governador da Paraíba, João Azevêdo (sem partido), convocou uma coletiva de imprensa em 23 de dezembro para comentar a sétima fase da Operação Calvário. Conforme as investigações do Ministério Público, parte do montante desviado pela organização criminosa foi usada na campanha que elegeu João Azevêdo com 58,18% dos votos válidos.

Politicamente rompido com Ricardo Coutinho e fora do PSB, partido presidido pelo ex-governador, João Azevêdo negou ter conhecimento ou participação no suposto uso de recursos ilícitos na sua campanha. “Nunca me reuni com quem quer que fosse para pedir dinheiro para campanha, muito menos com o senhor Daniel Gomes”, assegurou João.

O governador também garantiu que em seu governo não haverá continuidade de corrupção. “Não houve, não há e jamais terá compromisso de minha parte com qualquer ilegalidade. Se surgirem novas pessoas suspeitas, elas serão devidamente afastadas, como tenho feito desde o início”, cravou.

 

Operação Calvário: entenda investigação que desarticulou esquema em hospitais na Paraíba

Conforme MPPB, ex-secretária de administração Livânia Farias teria recebido, por mês, propina na ordem de R$ 80 mil paga pela Cruz Vermelha.

Livânia Farias permaneceu a maior parte do tempo calada durante audiência de custódia em João Pessoa — Foto: Walter Paparazzo/G1

Livânia Farias permaneceu a maior parte do tempo calada durante audiência de custódia em João Pessoa

A Operação Calvário foi desencadeada em dezembro de 2018 com o objetivo de desarticular uma organização criminosa infiltrada na Cruz Vermelha Brasileira, filial do Rio Grande do Sul, além de outros órgãos governamentais. A operação teve oito fases, resultado na prisão de servidores e ex-servidores de alto escalão na estruturado governo da Paraíba.

A ex-secretária de administração do Estado da Paraíba foi presa suspeita de receber propina paga pela Cruz Vermelha, que administrava o Hospital de Emergência e Trauma de João Pessoa. Entenda como começou e em que fase está a operação. A ex-secretária Livânia Farias teria recebido, por mês, propina na ordem de R$ 80 mil paga pela Cruz Vermelha.

O secretário executivo de Turismo, Ivan Burity, foi preso na quinta fase da operação, apontado como recebedor de propinas, em delação premiada feita pelo ex-assessor da secretaria de administração do estado, Leandro Nunes Azevêdo. A influência dele ocorreria tanto em contratos da saúde, quanto da educação, com destaque para esta última.

Aléssio Trindade, secretário de Educação do estado, foi alvo de um mandado de busca e apreensão. Além dele, o ex-executivo da pasta, José Arthur Viana Teixeira de Araújo também foi alvo da operação. De acordo com o Ministério Público, a investigação sobre eles ocorre por causa das suspeitas sobre inexigibilidade de licitações nos contratos suspeitos. O procedimento teria sido a porta de entrada para as irregularidades

O que a operação investiga

A investigação identificou que a organização criminosa teve acesso a mais de R$ 1,1 bilhão em recursos públicos, para a gestão de unidades de saúde em várias unidades da federação, no período entre julho de 2011 até dezembro de 2018.

A estimativa, no entanto, é inferior ao valor real do dano causado ao patrimônio público, já que só foram computadas as despesas da CVB-RS com uma pequena parcela de fornecedores que prestam serviços em unidades de saúde do município e do Rio de Janeiro, não alcançando os desvios de recursos públicos decorrentes da atuação da organização criminosa na Paraíba, que vem conseguindo centenas de milhões de reais desde o ano de 2011.

 

Um mandato de R$ 168 MI

Nenhum eleito em 2014 enriqueceu mas do que o deputado estadual Zeca Viana.

JOSÉ ANTÔNIO GONÇALVES Viana encara perguntas difíceis com a naturalidade de quem se sente intocável.

“Isso jamais me passou pela cabeça”, respondeu-me, sem transparecer indignação, quando lhe perguntei o que tinha a dizer sobre a denúncia de que teria contratado um pistoleiro para matar um adversário político.

Conhecido no Mato Grosso como Zeca Viana, o produtor rural e deputado estadual candidato à reeleição é dono de um patrimônio que, em quatro anos, passou de R$ 87 milhões para R$ 255 milhões, um crescimento de R$ 168 milhões. “São várias areazinhas (sic)”, deu de ombros, quando questionado sobre os 35 mil hectares de terras que controla – a maior parte, próprias; outras, arrendadas. Cultiva soja, milho e feijão. Zeca Viana é o senhor de uma área maior que Belo Horizonte.

Seu salto patrimonial declarado ao Tribunal Superior Eleitoral foi o maior do país entre políticos eleitos em 2014 que vivem em cidades com até 100 mil habitantes*. Assim como no caso do candidato Doda de Tião, nós decidimos conhecer Zeca Viana e seus domínios para entender como opera o poder político e empresarial longe dos holofotes da imprensa nacional em municípios que representam a esmagadora maioria do Brasil. “Percebi, em 2010, que eu estava com [o valor declarado] das minhas áreas totalmente defasado. Antigamente, se pagava imposto sobre o valor [declarado] da área, então sempre declarávamos um valorzinho (sic) mínimo”, relatou, confessando uma possível fraude fiscal como quem comenta a previsão do tempo. “Aí vi que tinha fazendas que valiam milhões [declaradas] por cruzeiros (sic) e fomos atualizando”, explica, sobre o aumento de patrimônio.

Zeca Viana recebeu o Intercept no gabinete que mantém na cidade em que vive há mais de 30 anos, Primavera do Leste. Localizada 240 km a leste de Cuiabá e com pouco mais de 60 mil habitantes, é uma das tantas localidades da região que cresceu de forma impressionante na esteira do dinheiro grosso gerado pelo agronegócio no oeste do país.

A cidade de apenas 32 anos tem infraestrutura notável para os padrões brasileiros – só uma via da área urbana ainda não tem asfalto –, IDH, o índice que mede o desenvolvimento humano de um local, é maior do que o da turística Campos do Jordão, a renda média mensal por domicílio (de R$ 2,1 mil) é quase mil reais acima do padrão brasileiro, e o PIB per capita de mais de R$ 50 mil está 20% acima da média nacional.

Primavera do Leste impressiona quem, como eu e o repórter fotográfico Theo Marques, chega ali pela primeira vez. Há bairros coalhados de mansões de fazer inveja a novos-ricos do eixo Rio-São Paulo, supermercados com prateleiras forradas de vinhos e uísques importados, escritórios de arquitetura que caberiam no Leblon, e uma clínica de cirurgia plástica que, pelo tamanho da casa e opulência da fachada, não parece ter problemas para diminuir papadas e endireitar narizes.

Os saudáveis índices econômicos escondem a verdadeira cidade. Primavera do Leste é visivelmente segregada: o centro, onde vivem os ricos, fica de um lado da MT-130, rodovia que corta o município; os bairros pobres, do outro – ainda que não sejam miseráveis como nos grandes centros urbanos.

Moradias populares em bairro periférico de Primavera do Leste.

Do outro lado da MT-130, pobreza.

 

Foto: Theo Marques/The Intercept Brasil

A fortuna de Zeca Viana não causa espanto no local. “Ninguém dá muita bola. Tem gente bem mais rica que ele aqui”, me resumiu um jornalista local que pediu anonimato. “Vê a casa dele? Tem outras muito, muito maiores.”

Pode ser. Mas dê uma olhada na evolução patrimonial de Zeca Viana entre 2006 – quando ele chegou a registrar uma candidatura a deputado estadual para depois desistir da disputa, declarando pouco mais de R$ 2,6 milhões em bens –, e 2018: um salto de 9.635% em 12 anos.

“Eu sabia que era por causa disso”, me disse Viana quando nos recebeu em seu escritório e ouviu a pergunta sobre a montanha de dinheiro que declarou ao TSE. Após ordenar a um assessor que gravasse sua resposta, “porque quero que vocês escrevam na íntegra o que eu vou falar”, ele ironizou a pergunta sobre se o crescimento de seus bens tinha a ver com sua atividade política.

“Para vocês da imprensa sempre tem irregularidade”, disse, antes de reclamar: “Tenho certeza absoluta que tem vários políticos com cinco, seis vezes mais patrimônio do que eu e não aparecem com um quinto do que eu tenho. Mas daí tudo bem. Para a imprensa, o correto é ocultar patrimônio.”

Fato é que seu patrimônio ajuda a cravar as estacas da oligarquia dos Viana na cidade. Como já está acontecendo.

Só dois prefeitos em 25 anos. Ambos ruralistas

A sala de espera do gabinete, localizado na área administrativa de um antigo armazém de agrotóxicos, está sempre cheia quando ele está por lá. Naquela segunda-feira de setembro em que esperávamos ser recebidos pelo político, a lotação era tamanha que, mesmo não sendo nem 10 horas da manhã, o pequeno aparelho de ar condicionado lutava sem sucesso para dar conta do calor de quase 30 graus.

Dividíamos o espaço com alguns agricultores, de chapéu na cabeça e botinas de couro rústico nos pés, e uma moça com capacete de motociclista na mão. Estavam de pé. Outros homens, sentados e vestidos com camisas e botas de grife, comentavam entusiasmados as intenções de voto em Jair Bolsonaro. Numa pequena mesa e num balcão, havia jornais e santinhos de campanha.

“O Zeca, pode ser o dia que for, se você chegar aqui, ele te atende”, comentava um dos sujeitos com ar de ruralista ao vizinho de poltrona. “Ali tem gente que [veio] para tratar de negócios, outros para tratar de política. Aquele senhor de chapéu me representa na cidade vizinha, Poxoréu“, me responderia o deputado, depois, quando o questionei quem eram as pessoas que estava conosco na sala de espera. “Deve estar agoniado para me pedir alguma coisa porque eu só mandei material [de campanha] para ele.”

Zeca Viana nasceu em 1956 em Ampére, uma cidadezinha do sudoeste do Paraná que hoje tem pouco mais de 18 mil moradores. Cresceu na roça, filho de um pequeno agricultor que era fã de Leonel Brizola. “Meu pai era carioca, brizolista. Quando Brizola voltou do exílio [em 1979] fomos lá em Foz do Iguaçu [onde o político desembarcou vindo do Paraguai]. E a gente criou o PDT em Ampére”, lembrou.

Com alguns irmãos, perambulou pelo Paraná produzindo em terras arrendadas até juntar dinheiro suficiente para comprar uma área no Mato Grosso – chegou a Primavera do Leste em 1985, um ano antes da emancipação do município.

Uma pessoa que acompanha a história da cidade desde o início e que pediu para não ser identificada me contou que Getúlio Viana, irmão de Zeca e de quem falaremos mais adiante, gosta de contar que trouxe toda a mudança da família num Chevette. Eram tempos em que havia tanta terra disponível na região que um dos pioneiros chegou a trocar uma área de centenas de hectares por um carro usado.

Em 1985, quando os Viana chegaram aonde hoje está Primavera do Leste, o lugar era apenas um distrito da agora bem menor Poxoréo – a emancipação viria no final do ano seguinte. Não havia uma única rua asfaltada. As levas de migrantes que subiram do Sul do país para a região também levaram os grandes adversários políticos dos Viana ao município: a família Piana.

“Por 24 anos e oito meses, o comando de Primavera do Leste ficou entre Érico Piana, que foi prefeito por quatro vezes, e Getúlio Viana”, contou-me um observador da política local que pediu anonimato. Como vocês já devem ter percebido, ninguém gosta de abrir o bico por lá. Érico Piana, hoje afastado da política, também é produtor rural. O que significa dizer que o ruralismo manda na cidade desde seu nascimento – o ciclo só foi quebrado em 2016, quando Leonardo Bortolin, do MDB, filho de uma família de classe média e com passagem pela União da Juventude Socialista na adolescência, aproveitou-se de uma crise política local para eleger-se prefeito.

Getúlio Viana chegou à prefeitura pela primeira vez em 2004 e conseguiu a reeleição quatro anos depois. A carreira política de Zeca, o mais novo de três irmãos, começou apenas em 2010, graças, segundo ele, a outro figurão local, esse com sobrenome famoso em todo o país: José Nardes, irmão de Augusto Nardes, relator do processo das pedaladas fiscais no Tribunal de Contas da União, estopim para o impeachment de Dilma Rousseff, atualmente enroscado na Lava Jato e com a Polícia Federal.

“José Nardes era nosso candidato a deputado estadual, mas fez um acordão, renunciou à candidatura e declarou apoio a nossos adversários. Daí Getúlio falou que eu tinha que ser candidato a deputado estadual. Foram 55 dias de campanha, e eu me elegi”, contou-me Viana.

‘Se tu mudar o que eu disse, vai ter problemas’

“Getúlio é que mudou de lado. Eu fiquei onde estava e retirei minha candidatura”, reagiu José Nardes, um sujeito que fisicamente se parece muito com Zeca Viana e é o atual presidente do Sindicato Rural de Primavera do Leste.

“[Zeca Viana] Não é meu desafeto. Mas acho um absurdo um deputado ficar oito anos representando sua cidade e não trazer uma emenda sequer. A única ressalva que eu tenho é essa aí. Como pessoa, problema nenhum”, ele disse, mostrando uma visão bastante pragmática da política.

Num impresso com tiragem de 25 mil exemplares – quase um para cada dois moradores da cidade – que fez questão de me entregar, Zeca Viana lista mais de R$ 2 milhões em obras e outros benefícios para a região que diz ter enviado a Primavera do Leste. A principal ligação entre os lados rico e pobre é um viaduto sob a rodovia, que o deputado garante ter sido concluído graças a um pedido dele ao governo federal, em 2016.

Apesar disso, a reclamação de Nardes me foi repetida por muita gente em Primavera do Leste – a tal ponto que alguns viam em risco a reeleição do deputado. “Não vou votar e não vou pedir voto para ele”, cravou Nardes.

Também perguntei ao presidente do Sindicato Rural se ele via algum indício de irregularidade no aumento patrimonial de Zeca Viana. Ele deu de ombros. “O setor em que nós trabalhamos tem bons momentos, então ele deve ter passado por bons momentos e acumulado [patrimônio]. Aqui nunca teve problema de frustração de safra”, falou, antes de se despedir me fazendo uma ameaça: “Só bota o que eu falei. Se tu mudar, tu vai ter problemas”.

‘Foi como ser patrolado’

Um dos “adversários” a que Zeca Viana se referiu é o radialista Luizinho Magalhães. Questionei-o como foi concorrer, em 2010, contra um homem com tal poder financeiro. “Foi como ser patrolado, né? Era o sentimento realmente de você ser patrolado pelo poder aquisitivo. Quem tem tanto dinheiro tem uma musculatura diferente para fazer campanha”, admitiu. Patrola, no linguajar sulista, é uma máquina usada para aplainar estradas rurais. No sentido figurado, segundo o dicionário, significa “devastar, dizimar”.

Para se ter uma ideia, o segundo candidato mais rico na Assembleia Legislativa do Mato Grosso, Dilmar Dal Bosco, do DEM, que também concorre à reeleição, tem um patrimônio declarado de R$ 19,8 milhões – o equivalente a 8,6% da fortuna de Zeca.

‘O governador só está no cargo porque levei ele pelo estado inteiro no meu avião e ele nunca pagou um litro de gasolina.’

Zeca Viana se esquiva ao ser perguntado se o dinheiro lhe facilita o trabalho de coletar votos. “Até atrapalha. Porque as pessoas acham que, se você tem dinheiro, então pode dar”, respondeu. “Eu ia falar [o que eleitores pedem], [mas] não vou porque senão vai ficar gravado o que eles tão pedindo. Mas acho que vão pedir até o final da campanha”, prosseguiu, gargalhando.

Ele também abusa da fanfarronice ao falar da própria influência política. “Esse governador atual [Pedro Taques, do PSDB] só está no cargo porque eu tive uma grande participação na campanha dele, levei ele ao estado todo com meu avião, e ele nunca me pagou um litro de gasolina”, contou. O avião é um Beechcraft Baron 58, ano 2000, declarado por R$ 560 mil em 2014. No mercado, entretanto, o valor é maior: um exemplar do tipo fabricado em 1974 custa R$ 850 mil, e os modelos da década de 1990 saem por mais de R$ 1 milhão.

O que amargura o deputado não foi ter gasto o dinheiro para abastecer o avião, mas a rusga que se seguiu à posse do governador. “Logo no início do governo [de Pedro Taques], estávamos discutindo sobre cargos [de confiança em órgãos públicos] no interior, [e pedi] para darmos preferência a nossos companheiros de coligação. E ele optou por favorecer um adversário nosso”, disse Viana.

A “familiocracia” dos Viana

Hoje há mais Vianas na política local. A sobrinha-neta dele, Renata Viana, candidatou-se a deputada federal. Recebeu uma força do tio – seu número está no santinho dele. A mulher de Zeca, Ivanir Maria Gnoatto Viana, é vereadora em Primavera do Leste. Elegeu-se para o primeiro mandato em 2016, graças à força do sobrenome – além de contar com Zeca como cabo eleitoral, Getúlio disputou a eleição para prefeito da cidade – e venceu.

Também há reveses políticos na conta da família. Mesmo tendo ganhado nas urnas, Getúlio já havia sido condenado por improbidade administrativa e acabou tendo o mandato cassado após oito meses. Apesar disso, é defendido com vigor pelo irmão deputado.

“Getúlio revolucionou esta cidade. Foi muito dedicado, tanto que 98% dos processos que respondeu na Justiça foi por querer atropelar a fazer as coisas, não aguardar o sistema. Ele é muito corajoso e tem uma ótima visão administrativa. Tanto que deixou a cidade como deixou, um espetáculo”, argumentou. Telefonei a Getúlio Viana pedindo uma entrevista, mas ele se recusou- a falar com o Intercept.

‘Ganância de poder nunca passou nem vai passar na minha cabeça.’

Zeca Viana também não se abalou quando o confrontei com denúncias contra ele. Uma investigação recente do Ministério Público o coloca como suspeito de usar notas fiscais frias para justificar o pagamento de R$ 150 mil em verbas indenizatórias da Assembleia Legislativa. “Eu acho que deveria estar precisando, R$ 150 mil, é muito dinheiro”, ele respondeu, me ironizando, antes de retomar a seriedade. “É muito dinheiro, não deixa de ser, mas é isso que ia me levar a fazer qualquer coisa errada. Teria que ser, talvez, 150 milhões pra cima, daí o cara começar a pensar”, riu, antes de atribuir a suspeita a uma armação do adversário Pedro Taques.

Os Viana se orgulham muito do trabalho que fazem na política local, uma autoconfiança que gera críticas. “Na visão deles, ninguém presta, só eles”, disse o radialista Luizinho Magalhães, quando o perguntei como descreveria o jeito de fazer política do clã. Um comentário que ouvi de várias outras pessoas na cidade, inclusive de José Nardes. “No momento em que entra na política, você tem que trabalhar pelo teu município, teu estado, teu país, e esquecer o resto, os laços de amizade. Isso não aconteceu com nosso amigo, o deputado Zeca Viana.”

“Eles estão implantando uma familiocracia por aqui”, resumiu um adversário dos Viana, que pediu para não ser identificado temendo represálias – um comportamento comum na cidade. O atual prefeito, Leonardo Bortolin, do MDB, e Érico Piana, adversário histórico da família, recusaram meus pedidos de entrevista após saberem qual seria o tema delas.

Um funcionário público me disse que a família Viana tem por hábito retaliar quem vê como adversário na política. “Ou você está com eles, ou não está. Até servidores de carreira são perseguidos por terem ajudado nas gestões dos rivais”, contou-me, naturalmente pedindo anonimato.

“Ganância de poder nunca passou nem vai passar na minha cabeça”, respondeu Zeca Viana, antes de se contradizer. “Não me vejo como prefeito de Primavera nunca. [Mas] Não posso lhe dizer também que não vou ser. De repente vem aquela pessoa que você não quer, indesejada, na cidade que você mora, que ajudou a construir, e não quer ver mal administrada. Então, é possível fazer até um sacrifício.”

*Chegamos ao nome de Zeca Viana por meio de um levantamento feito a pedido do Intercept na base de dados do Tribunal Superior Eleitoral pela Open Knowledge, organização sem fins lucrativos que construiu a plataforma Perfil Político. Foram considerados políticos de cidades de até 100 mil habitantes eleitos em 2014 e que assumiram em janeiro de 2015 cujo patrimônio era superior à média geral dos candidatos declararam ao TSE, que foi de R$ 388.826,86 em 2014.